Ela me faz chorar, mas eu não vivo sem ela. Posso evitá-la, tentar disfarçar, fingir que não está ali. Mas não dá para enganar o coração por muito tempo. Da cebola e do amor, não vale a pena fugir. Eles te alcançam algum dia, em algum lugar.
Amar e picar uma cebola exigem alma corajosa e cansada da solidão. Nada de temperos prontos ou paixões enlatadas e sem sabor. Tem que ir até o fim, sentir no coração e no estômago.
Tem que pegar uma cebola escolhida pelo olhar, sem muita razão, descascá-la e descobrir todas as suas camadas. Pode dar preguiça e medo de fazer isso de novo, sofrer e terminar com cebola e coração em pedaços.
Mas às vezes é tão bom chorar… Sertanejo no rádio e uma nuvem de lágrimas que só a cebola provoca.
E enquanto chora, pensar em todos os amores doídos que a sua história já descascou. O sertanejo e a cebola te deixam chorar aquele choro guardado que vem não sei de onde.
Aproveitar cada milímetro da faca cortando os pedaços, deixar o mundo de lado e chorar o quanto quiser. “Desculpe, mas eu vou chorar. É a cebola."
E depois, seu cheiro vai ficar (a cebola não ensina a esquecer), como um fio de cabelo que faz lembrar da pessoa amada.
E você vai encontrá-la de novo, mesmo se não quiser. O amor e a cebola estão nas esquinas, em qualquer lugar, num pastel de feira, numa esfiha de bar. Na sopa, no patê, não dá para escapar. Mas não tenha medo. Junto com o choro, vem a doçura picante que deixa a vida temperada e os corações ardidos. Sem lágrimas, só tem secura. Prefiro os olhos molhados, a cebola cortada e a alma lavada.