Há algo de sagrado em se fazer um pão. Sensação de entrar em contato com uma memória ancestral, um alimento essencial do corpo e da alma que o homem foi destinado a perpetuar. Amassar e cansar os braços por minutos intermináveis e meditativos, apertando aquela massa disforme e grudenta, que aos poucos vai se transformando, ganhando textura lisa e firme e revelando a forma dos seus dedos, como pegadas que dizem quem passou por ali.
E parece que o pão sabe quem é você, sabe o que você está sentindo, as alegrias, tristezas e sonhos que imprimiu em cada toque. Um ouvinte gentil, que te escuta pelo tato, sem julgamentos. Depois, como um amante fatigado de tanta entrega, vai descansar num canto quente da cozinha. E, em seu sono, sonha tanto que cresce, alcança o céu e se transforma numa nuvem macia com um cheiro vivo de fermento e calma, que dissipa todas as mágoas sovadas e choradas.
Ao toque das mãos, o pão é moldado e vai ao forno cumprir seu destino, expandindo-se até ficar imenso e dourado, preenchendo o ar e os pensamentos de paz e calor. Generosa, a pequena bolota de massa, do tamanho de um coração, é agora alimento para alguns dias ou alguns estômagos.
Pão quente a gente parte e reparte, e agracia com um naco de manteiga que se derrete e se entrega ao menor contato. Um alimento para partilhar e perdoar, prazer sereno do que é simples e profundo.
O pão tem a humildade e a grandeza dos sábios, permeia nossa rotina com sutileza e verdade. Observa nossos dias, nossas manhãs melancólicas, nossos jantares festivos. Acompanha receitas, lembranças e lambanças. Farinha até as orelhas e migalhas pelo caminho.
Para fazer pão e amor não pode ter preguiça. As pequenas grandiosidades da vida merecem dedicação. Cozinha bagunçada, corpo cansado e esperança renovada. Faça pão. E faça as pazes.
Receita: Pão para partilhar